Juma (Alanis Guillen) em Pantanal (divulgação) |
Pantanal foi escrita e produzida em 1990, num tempo em que a televisão brasileira vivia uma efervescência criativa impulsionada pela abertura política e o fim da censura. Neste contexto, o autor Benedito Ruy Barbosa encontrou na extinta Manchete um solo fértil para colocar em prática um projeto ousado, que implicava em muitas gravações externas, longas cenas de paisagem, algum erotismo e uma trama simples, mas toda emoção.
Embora tenha perdido a chance de produzir Pantanal em seus próprios terrenos, a Globo também vivia uma boa fase. A emissora, naquele período, consolidava o time que assinaria algumas de mais suas importantes novelas das oito/nove daquela década, e que ditaria os rumos do horário. Silvio de Abreu estreava ali com Rainha da Sucata, enquanto Gilberto Braga, Gloria Perez, Manoel Carlos, Aguinaldo Silva e o próprio Benedito, que voltou à Globo em alta após Pantanal, deixariam uma marca e um legado.
O time da faixa mais nove da emissora líder se tornou tão presente, que, para alguns críticos, as décadas de 1990 e 2000 na teledramaturgia brasileira ficou marcada como a era das “novelas de autor”. Benedito era o autor das tramas rurais, enquanto Aguinaldo Silva era o “rei” do regionalismo e do realismo fantástico. Já Gilberto Braga era o criador das tramas urbanas que desnudavam a alta sociedade, enquanto Silvio de Abreu se tornou o pai do thriller no horário nobre. Por fim, Maneco era o autor das crônicas cotidianas urbanas.
Em comum, este time “classe A” arrebatava o público pela emoção. Todos imprimiram suas marcas dentro do folhetim. Sem abrir mão do melodrama, eles conseguiram consolidar uma receita que respeitava as melhores características do novelão puro, mas sem perder de vista a importância de se contar uma história bem construída e tratar de assuntos relevantes.
Isso se perdeu nos últimos anos. Sem desmerecer as obras mais recentes, já que houve sim produções muito boas, mas havia algo de artesanal nas tramas dos grandes medalhões que ficou no passado. Hoje temos algumas experimentações bastante válidas, mas a impressão que dá é que a emoção se perdeu neste processo.
O fato de o remake de Pantanal ter conseguido trazer de volta boa parte do público que dispersou no período de reprises e da exibição de Um Lugar ao Sol é bastante significativo e dá alguns recados à direção da Globo. Uma novela com o jeitão Benedito de ser, ou seja, mais lenta e contemplativa, deu certo nos dias de hoje. A trama atraiu o público que, até esses dias atrás, exigia tramas cada vez mais ágeis.
Ou seja, o remake de Pantanal serviu para mostrar que uma “novela à moda antiga” pode funcionar nos dias de hoje. O êxito da adaptação de Bruno Luperi deixou claro que o novelão despudorado, quando bem feito, consegue reunir a família diante da TV. Em tempos de streaming, isso é um feito e tanto.
É verdade que a audiência de Pantanal não se compara a êxitos recentes, como A Dona do Pedaço (2019) ou A Força do Querer (2017). Mas sua capacidade de mobilização e engajamento não era experimentada há muito tempo por uma novela da Globo (arrisco dizer que Avenida Brasil foi a última a causar este tipo de comoção). Ou seja, o sucesso de Pantanal não tem a ver com números, mas sim com os sinais evidentes de que a novela “pegou”, ditou moda e gerou discussão. Isso é inegável.
Com isso, Pantanal trouxe alguns ensinamentos à direção da Globo. É preciso um olhar atento ao passado e uma estratégia para resgatar alguns dos elementos que faziam um bom novelão, e que ficaram esquecidos no decorrer dos anos. Os novos autores deveriam se debruçar sobre a obra dos veteranos e reverenciar o que de melhor já foi feito. Mas, claro, dando um toque moderno e aperfeiçoando sempre, afinal, as coisa evoluem.
André Santana
09/10/2022
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